8 de setembro: Nossa Senhora da Vitória

Pedro Gouveia | Nossas comunidades celebram hoje (08/09) a Festa da Natividade da Virgem Maria, nove meses após a Solenidade de Sua Imaculada Conceição. Concomitantemente, a Arquidiocese de Vitória do Espírito Santo festeja sua padroeira, Nossa Senhora da Vitória, título da Mãe de Deus dado à sua Catedral Metropolitana e à capital do Estado. No Evangelho desta liturgia, refletimos a genealogia de Cristo Jesus narrada por São Mateus (1,1-16.18-23 ou 18-23). Voltado aos judeus, que já conheciam a natureza divina do Verbo, a perícope destaca-nos a geração de Jesus segundo a carne, em Nazaré da Galiléia. Conhecido como o “livro da geração”, o trecho do Evangelho lista sucessivas progênies, singularizando-as e destinando-as a uma só, a do Senhor Jesus, pois a raiz de todas elas são incluídas na economia salvífica divina para a história da humanidade: verdadeiramente, Deus se fez homem.

O início do Evangelho segundo São Lucas também relata a descendência de Jesus. Porém, este não é o artifício de São Mateus no trecho meditado na Festa de hoje: iniciando a narrativa da descendência do primeiro homem, como no Gênesis: “Eis a lista da família de Adão” (Gn 5,1), o autor sugere o livro de uma nova gênese, um novo princípio, que toma o lugar e substitui a geração de Adão, marcada pelo pecado original. Ascendentemente, a história passada encontra seu sentido em Jesus. Em um recurso sintático, a genealogia de Jesus comporta uma progressão ininterrupta de nomes, clãs, famílias e tribos, divididas em três segmentos e dois setenários em cada etapa. A gematria indicada pelo evangelista (a associação de 3, 7 e 14, no qual 10 significa o Decálogo e 4 os Evangelhos) já revelam a plenitude divina inserta na concretude e realidade temporal de um povo: Jesus é filho da história humana e da promessa divina.

Reconhecido como Profeta, Sacerdote e Rei por excelência, desde o ventre materno Jesus foi ungido em santidade pelo Espírito Santo. “Rosto divino do homem e rosto humano de Deus”, é o Espírito que lhe confere o título de Cristo, Salvador e Redentor do mundo. “Filho de Davi, filho de Abraão” (Mt 1,1), Nosso Senhor é descendente dos depositários da promessa feita a ambos que se realiza plenamente Nele: à Abraão (sacerdote e profeta), Deus faz votos da bênção à todas as nações por sua raça (Gn 22,18) e à Davi (rei e profeta), jura descendência permanente (Sl 131, 11). Reúne, portanto, em si a tripla dignidade destes dois antepassados: o Messias esperado, da raça davídica (enraizado no povo eleito), é o detentor da herança das nações, a Igreja (precedida pela fé abraâmica).

No relato do Evangelho, mencionam-se quatro mães, por parte pecadoras e estrangeiras: Tamar, nora de Judá que o engana e o seduz (Gn 38); Raab, prostituta que esconde espiões (Js 2); Rute, estrangeira moabita; e Betsabéia, a adúltera mãe de Salomão (2 Sm 11). ntre os antepassados encontram-se desde a grandeza como a miséria humana. Ilustrá-las nesta passagem, retrata (ainda que insolitamente) a totalidade da salvação messiânica: Jesus Cristo é solidário com os pecadores e salvador de todos. “Todos pecaram e estão privados da glória de Deus. E só podem ser justificados gratuitamente, pela graça de Deus, em virtude da redenção no Cristo Jesus” (Rm 3, 23). Esta certeza deve conduzir nossa caminhada de fé, nosso testemunho autêntico de cristãos: Deus se faz homem em Jesus, adentrando profundamente o complexo das gerações humanas. Conhecedor da humanidade vacilante, os apelos que a Ele dirigimos não se tornam vazios, porque sua fidelidade é eterna.

A quinta mulher mencionada é Maria: não dita como esposa de José, mas ao contrário, “José esposo de Maria” (como nos fala São Paulo aos Gálatas 4,4: “nascido de Mulher”). No seio da Virgem Mãe, o Verbo se faz carne para salvar-nos, reconciliando-nos com Deus (Doente, nossa natureza precisava ser curada; decaída, ser reerguida; morta, ser ressuscitada. Havíamos perdido a posse do bem, era preciso no-la restituir); para que, assim, conhecêssemos o amor de Deus; para ser nosso modelo de santidade; para tornar-nos “participantes da natureza divina” (2Pd 1,4): “Pois o Filho de Deus se fez homem para nos fazer Deus. Portanto, o culto da Natividade de Maria deve-nos propor a reflexão de uma verdade profunda: a vinda no homem-Deus na terra foi preparada por longos tempos pelo Pai no decurso dos séculos.

Ademais, a divindade do Salvador supera infinitamente as infidelidades do povo eleito. Quis assim a tradição cristã celebrar e venerar as pessoas e os acontecimentos que prepararam a vinda do Cristo na humanidade e na graça. Sua Mãe Santíssima e seu nascimento, sua concepção, seus pais e antepassados. Acreditar nestes episódios que antecedem e preparam a Encarnação, faz-nos reconhecer a participação e colaboração do homem na salvação do mundo. A verdadeira devoção a Maria sempre leva-nos a Jesus: por Ela, se inicia o Novo Testamento e a promessa vitoriosa e redentora da Nova Aliança. Por Maria, Jesus chega até nós.

Pedro Nunes Gouveia

Seminarista do 1º ano de Teologia

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